8 de jun. de 2007

Escola Yorenka Ãtame, dos Ashaninkas, dá curso para monitores da Reserva Extrativista do Alto Juruá

Benke aconselha Universidade da Floresta a ter um olhar mais profundo sobre a sobrevivência do povo

por Flamínio Araripe*

O primeiro curso da escola Yorenka Ãtame (Saberes da Floresta) dos Ashaninkas, construída no rio Amônia na margem oposta ao município de Marechal Thaumaturgo, reuniu índios e brancos da Reserva Extrativista do Alto Juruá (Reaj).

O encontro teve o objetivo de treinar os monitores da Reaj, disse Benke, Ashaninka coordenador e criador da escola.

"Essa escola pode ser um braço muito importante para a Universidade da Floresta, no futuro", afirma Benke. Também participaram do encontro os antropólogos Mauro Almeida e Manuela Carneiro da Cunha, da Unicamp.

"Foi uma experiência muito importante. Não tem muita coisa a ficar discutindo. Temos que fazer mesmo. As coisas já estão prontas", disse o coordenador da escola.

Benke avalia que hoje há muita discussão sobre como vamos fazer com relação aos problemas ambientais. "Tem muitas pessoas quase gritando que está se acabando a floresta, o ar, as águas, estão mudando o clima. Mas isso está acontecendo porque a gente não está construindo para amenizar o que está acontecendo. A parte científica deve se voltar para o lado prático também", aconselha.

O líder Ashaninka observa que muitas pessoas jovens estão aprendendo a parte acadêmica. "Mas quem está avançado deve colocar essa coisa na prática, tanto ensinar como colocar na prática. A escola Yorenka Ãtameestá pra disso", assinala.

"Se a Universidade da Floresta quer desenvolver algo ligado à Amazônia, ao Acre e ao povo da região, temos que ter um olhar mais profundo sobre a sobrevivência do povo", disse Benke.

Após participar de um encontro na Reunião Anual da SBPC sobre manejos florestais, ele criticou o enfoque econômico dado ao tema, à visão de apenar tirar madeira.

Como manejar, segundo Benke, é a coisa mais séria. "Estão estudando o que vem de fora: a experiência de manejo florestal que aconteceu na Europa - França, Alemanha, Inglaterra - e Estados Unidos, a parte acadêmica sobre os planos de manejo dos recursos de uma forma econômica. Para a gente, não dá para copiar aquele modelo de fora".

Na Europa tem pouca floresta nativa, muito já foi destruído e o que resta na maioria é monocultura de pinheiro e outras espécies, observa Benke. "Temos que ter o nosso inventário porque muitas coisas boas já foram construídas com essa diversidade de madeira, a ciência e a consciência que o povo tem aqui sobre esse manejo", acrescenta.

"Se a Universidade da Floresta está prevendo uma sustentabilidade dos recursos florestais, precisa ter uma visão do que o povo aprendeu na floresta. A experiência daqui pode ser um primeiro modelo universal", avalia Benke.

Segundo ele, temos uma grande diversidade de madeira, de plantas e experiência do povo da floresta – seringueiros, índios e agricultores.

Na concepção de Benke, "a Universidade da Floresta tem uma coisa estratégica científica grande que deve ter um olhar mais profundo sobre a realidade daqui".

Enquanto o projeto da Universidade da Floresta não sai do campo da discussão e permanece como um campus avançado da Ufac com cinco cursos em Cruzeiro do Sul, a escola Yorenka Ãtame procura por em prática a transmissão dos saberes da floresta dos índios para os extrativistas e ribeirinhos.

"A Escola é um desafio grande para o nosso povo para enfrentar até mesmo os conhecimentos acadêmicos. A gente aposta nessa experiência que pode ser uma estratégia para essa população da região do Juruá", acentua Benke.

Para ele, a Yorenka Ãtame pode ser um exemplo de como restaurar o meio ambiente e ter uma facilidade muito mais prática de ensinar os ribeirinhos.

De acordo com Benke, a escola veio com o fim de mostrar um novo modelo que a comunidade Ashaninka desenvolveu voltado à segurança e sustentabilidade alimentar.

A experiência, ele conta, "surgiu de uma necessidade por falta de organização dos representantes municipais. As coisas ficam muito entregues na mão do governo, prefeitura, dos políticos, e muito pouco nas mãos dos representantes do cooperativismo", constata.

A escola está prevendo receber até 80 pessoas de uma vez, 40 pessoas em cada curso. O primeiro passo que é a construção, já foi dado e a obra física foi terminada. Falta colocar água com um poço artesiano e luz, mas a Internet já está chegando, relata Benke.

Mesmo sem ter terminado a infra-estrutura, foi dado um curso em parceria com a Unicamp. Benke conta que já está sendo preparado o projeto para receber as pessoas na escola. "Precisamos de recursos para o primeiro curso", informa.

*Flamínio Araripe, Jornal da Ciência, de 08 de Junho de 2007.

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